Os políticos costumam aplicar “grandes palavras” nos seus discursos. Cada vez que uma mudança na sociedade requer um pouco mais de esforço, chamam-lhe uma batalha, e em tempos de emergência, estão imediatamente em guerra com algo ou alguém. Esta retórica muito política foi também adotada pelo mundo dos negócios e assim também nos recursos humanos chegámos à guerra pelo talento!
As guerras sempre têm consequências imprevistas; contudo, esta “guerra pelo talento” tem dado lugar a uma variedade de modelos de gestão e atribuiu-lhes nomes elegantes como cultura organizacional, marca do empregador, análise de pessoas, experiência dos candidatos… Todo com o objetivo para atrair e reter os melhores talentos.
Estas batalhas desta guerra ocorrem entre empresas, quer sejam as grandes onde “todos querem trabalhar”, ou nas pequenas e médias com ideias e produtos fantásticos, que com a ajuda dos melhores talentos, poderiam fazer inclusivamente grandes avanços mundiais.
Ainda assim, tenho impressão de que a “guerra pelo talento” ocorre entre empregadores e candidatos. Aqui há algumas reflexões sobre porque tenho esta opinião:
– Cultura Corporativa: a cultura corporativa é algo que deve ser coerente sem compromisso. Inclusivamente organizações que são conhecidas pela sua “cultura organizacional forte”, tendem a comprometer as violações da cultura corporativa justificando-o com frases como “sabemos que é um idiota com as pessoas, mas é excelente para os negócios”.
– Marca do empregador: um conceito excelente que combina marketing, recursos humanos e comunicação interna. Apesar dos fantásticos exemplos, a maioria destas estratégias são, na minha opinião empresas que falam exclusivamente de si mesmas, sem vincular as mensagens com os talentos que desejam. Há muita abordagem de “recompensa e castigo” para o meu gosto.
– Experiência dos candidatos: com toda a tecnologia disponível, ainda temos uma percentagem extremamente alta de candidatos que não recebem nenhum comentário sobre o resultado do processo de recrutamento. Isto pode parecer um detalhe, mas indica uma abordagem a curto prazo do talento. É possível que alguns perfis não nos convenham desta vez, mas é também possível que os necessitemos no futuro. Será muito mais difícil voltar a atrair um candidato num novo processo de seleção se não lhe foi proporcionado nenhum comentário no processo anterior.
Qual será o impacto da crise COVID-19?
Podemos ouvir em todo o lado que depois desta crise já nada será igual. É realmente um ponto de inflexão que mudará o mundo desde a sua raiz. Mas será para melhor? Sinceramente, não sei. O meu coração diz-me que tenha esperança, e o meu cérebro diz-me que duvide.
- Negócios: o dano já é enorme! A economia mundial sobreviveu com dinheiro virtual durante décadas, pelo que visto desse ângulo, isto pode ser apenas um reinício, mas não um dano vital. De qualquer modo, as empresas vão reorganizar-se, otimizar-se, digitalizar-se, transformar-se, o que for necessário para salvar o capital. Algumas deixarão de existir por uma razão ou por outra.
- Individual: espera-se que um individuo saia desta crise com mais empatia, mais humano, orientado não só para si mesmo, mas também para o bem-estar da comunidade. Se assim será não sei.
Um dia, quando se declarar o fim da “guerra contra o vírus” a nível mundial, um individuo terá um único recurso garantido à sua disposição: o SER. Necessitará de analisar esse novo mundo e o meio ambiente que ele ou ela têm. Assim como as organizações que estão a ponto de se transformar, as pessoas terão que redescobrir o seu propósito neste mundo, redefinir objetivos e prioridades e atribuir recursos. Noutras palavras, redesenharemos o existente ou criaremos o nosso projeto de vida do zero, o trabalho é só um segmento desse projeto.
Apesar de ao longo da minha vida ter falado sobre projetos de vida durante anos, nos meus cursos para recrutadores de uma forma ligeiramente diferente devo agradecer a Faber Zapata Agudelo, por esta grande frase que recentemente encontrei ao traduzir um texto para o blog de PDA. “O projeto de vida de um individuo converte-se na chave para o futuro do recrutamento de talentos”. Porquê? Podemos fazer qualquer coisa com as campanhas de marca do nosso empregador para atrair os melhores talentos, podemos ter uma cultura organizacional fantástica e um bom ambiente de trabalho, podemos proporcionar uma excelente experiência para os candidatos. Sim podemos! Podemos identificar todas as competências que necessitamos, todas as características de comportamento, todos os potenciais dos candidatos. Sim podemos e temos as ferramentas para o fazer.
Contudo, se não demonstramos e asseguramos aos candidatos que o que temos para oferecer é ajudá-los a atingir o seu projeto de vida, e não só os nossos objetivos comerciais é muito provável que esse talento não se torne parte da nossa organização.
Procure oportunidades para encontrar um lugar para a sua cultura corporativa, para a sua marca e para os projetos de vida dos seus candidatos. Procure pontos de encontro entre o seu “projeto corporativo” e projetos de vida do candidato, já que isto permitirá que os ambos projetos tenham sucesso em paralelo.
Se continua a procurar os candidatos “que melhor se adaptem” ao seu projeto corporativo percebe-se como mais importante e o candidato nunca permitirá que nada empurre o seu projeto de vida para trás.
Os projetos de vida existiam antes da COVID-19. Agora tornaram-se ainda mais importantes!
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